Os Sibaritas não existem mais?

Como é sabido, os presentes gregos não costumam ser muito convenientes para quem os recebe… Na Antigüidade, já Tróia teve a oportunidade de comprová-lo ao ganhar o célebre cavalo de madeira.

Os gregos também souberam presentear a velha região do Lácio (atual Itália central). A ela viajaram com o intuito de divulgar os seus costumes e fundar diversas cidades, algumas das quais marcaram profundamente a história da “bota” itálica. Ainda hoje, é possível visitar muitas das ruínas dessas antigas cidades. Sem embargo, há uma da qual nada restou: Síbaris.

Fundada em 720 a.C, foi uma das mais importantes colônias helênicas, contudo, acabou sendo corroída por um dos defeitos mais avassaladores que existem:  a indolência. Algumas das razões de essa cidade ter desaparecido por completo ecoam ao longo dos tempos; como também, pitorescos episódios, os quais pelo seu caráter absurdo, invariavelmente provocam o riso.

Conta-nos Sêneca, um dos mais eruditos romanos do século I a.C, a história de certo homem sibarita que dera-se à rara tarefa de recobrir o seu precioso divã com pétalas de rosa, a fim de usufruir ao máximo o conforto noturno oferecido por tão macias e aromáticas flores. No dia seguinte, qual não foi o desgosto do seu vizinho ao ter de aturar os protestos do acomodado homem, pois este não conseguira conciliar o sono!  Qual fora a causa de tal desgraça, perguntou-lhe assombrado o primeiro. O outro alegou não ter conseguido fechar as pálpebras para descansar, pois uma pétala amassada, abaixo das suas costas, tinha-lhe irritado a pele…

Quantas histórias como esta já ouvimos contar.  Muitas talvez cheguem a tocar na lenda, entretanto, não estarão muito longe da realidade desse povo… O certo é que vivia entregue ao gozo da vida e seu péssimo comportamento acarretou-lhe a ruína, tornando-se uma advertência para todos os tempos.

Síbaris tinha seus desfiles militares como uma das mais importantes comemorações. Os trajes eram folgados e caricatos.  Nas festas que se seguiam, a comida era abundante até o excesso e, como não podia faltar, as danças eram intermináveis.

Ano após ano, começaram a achar sem graça o passo da cavalaria, o qual lhes parecia demasiado repetitivo.  Então, os sibaritas deram-se o trabalho de amestrar os seus cavalos, a fim de também estes fazerem parte das coreografias. Após muitas tentativas, conseguiram finalmente incluir o elemento eqüino nos seus ridículos bailes.

Entretanto, em 510 a.C, essa cidade do sudeste da “bota” itálica entrou em guerra contra Crotona, a qual ficava a 110 quilômetros de distância em direção ao sul.

Era chegada a hora do combate… Fileiras cerradas, capacetes apertados, lanças em riste! Tudo parecia estar preparado, mas somente lhes faltava uma coisa: o tirocínio. Os sibaritas encetaram a sua numerosa carga de cavalaria e, nesse instante, os crotoneses aproximaram as suas “armas secretas” dos lábios e simplesmente, com um belo concerto de gaita, puseram a dançar toda a cavalaria dos rivais…

Só isso foi suficiente para comprar o desastre de Sibaris!  Que fiasco! De tal maneira a sua população foi dizimada e as suas construções destroçadas que, hoje em dia, não se conhece de modo exato a sua localização geográfica.

Uma consideração final. Torna-se desnecessário provar, para qualquer homem, que os bens terrenos passam. Basta observar a realidade. Ora, quem neles deposita a sua felicidade, cedo ou tarde, acabará perdendo-a. Por isso, os sibaritas não só perderam a batalha, mas também, a aparente felicidade da qual se gabavam.

E, com muita propriedade, o termo “sibarita” passou a ser utilizado, ao longo da História, para denominar alguém entregue à indolência e ao gozo da vida. De fato, Síbaris desapareceu para sempre, mas, às vezes, ao nos depararmos com certo tipo humano frequentemente observado no mundo moderno, somos levados a nos perguntar: Será verdade que aquele povo da Antiguidade, de algum modo, não deixou descendência?

Texto: Sebastián Correa Velásquez